Saudade e entendimento

Me incluo entre aqueles que dizem não ter medo de morrer, mas que sentirão muita saudade das pessoas amadas que permanecerão na Terra. De fato, a dor da separação, principalmente se tratando de quem amamos verdadeiramente, é um dos maiores flagelos da desencarnação. Todavia, é de fundamental importância o entendimento acerca do plano espiritual e das Leis Divinas para superarmos esse doloroso momento, presente tanto no coração de quem vai, quanto no de quem fica.

André Luiz nos informa sobre interessante diálogo travado entre Alfredo, o administrador do posto de socorro filiado à colônia Campo da Paz, e um senhor de expressão humilde e simpática chamado Alonso. O velhinho queria saber se Alfredo havia recebido notícias de seus familiares na crosta. O administrador informou-o que sua viúva permanecia extremamente triste e que seus filhos, não obstante estarem bem de saúde, continuavam muito ansiosos em virtude da ausência do falecido pai.

Creio que todos podemos imaginar o aperto que Alonso sentia no peito. A saudade era imensa, assim como a preocupação com o bem-estar da família terrena. Comovido com a situação do querido colaborador, Alfredo pediu-lhe para que não se angustiasse, pois como pai zeloso mesmo estando distante fisicamente, Alonso trabalhava no plano espiritual buscando concretizar algumas medidas em favor de seus familiares. Lembrou-lhe sobre os cuidados necessários para administrar a saudade, para que ela não fosse um instrumento de desorganização mental, pois “a saudade que fere, impedindo-nos atender à Vontade Divina, não é louvável nem útil. É enfermidade do coração, precipitando-nos em abismos insondáveis do pensamento. ” [1]

O Espiritismo nos ensina que, de acordo com o seu teor, os pensamentos emitidos por encarnados repercutem nos desencarnados de forma positiva ou negativa, causando-lhes sensações de contentamento ou desarmonia. Alonso, embora já demonstrando melhoria significativa em sua vida mental devido aos deveres assumidos no posto de socorro, sentia-se de fato renovado em termos espirituais. No entanto, quando se concentrava nas habituais preces noturnas, sentia pensamentos dolorosos da esposa e dos filhos chamando por ele, penetrando profundamente em sua mente. Isto o perturbava e lhe prejudicava no trabalho diário. Dizia ele: “Que chefe de família não se sentiria atormentado, ouvindo angustiosos apelos do lar, sem meios de atender, como se faz indispensável? (…) quisera rogar aos meus calma e coragem, esclarecendo que meu coração ainda é frágil e necessita do amparo deles; estimaria pedir-lhes esse auxílio para que eu possa atender às atuais obrigações, sem desfalecimentos. ” [1]

Convidando o servidor à reflexão minuciosa sobre o assunto, Alfredo ponderou que seria até possível estabelecer comunicação entre Alonso e sua família, embora com prejuízos à manutenção da própria paz. O administrador salientou a importância da resignação diante dos desígnios de Deus. Se Alonso e a esposa estavam separados é porque ambos necessitavam de novas experiências no campo evolutivo. Tanto ele quanto ela sofriam as dificuldades causadas pela separação, as quais deveriam ser convertidas em oportunidades de aperfeiçoamento espiritual. Os filhos estavam chorosos, desalentados e revoltados diante da desordem doméstica que se estabeleceu após o desencarne do pai. Entretanto, antes de tudo, eram filhos de Deus e, sob o amparo do Mais Alto, precisavam definir responsabilidades e assumir as rédeas das respectivas realizações. Enquanto no mundo físico, Alonso já havia feito tudo o que podia por eles. Estava na hora de se conformarem com a realidade e se tornarem protagonistas de suas existências. O velhinho, tão sincero em seus sentimentos e tão dedicado aos seus familiares consanguíneos, não possuía naquele momento preparo suficiente para tudo ver no antigo lar sem sofrer desastrosamente. Era imperioso deixar o tempo passar. Agradecido, ele compreendeu as justas ponderações de Alfredo, que rogou a Deus que lhe abençoasse o entendimento.

Realmente não é fácil nos desapegar das pessoas que amamos. É claro que podemos sentir saudade e até chorar pelos nossos entes queridos que já partiram para a Pátria verdadeira. Porém, a grande diferença está na forma pela qual extravasamos sentimentos e emoções. Se o choro for de gratidão e reconhecimento, se for uma saudade permeada pela certeza do reencontro, podemos ter a certeza de que tais energias farão muito bem àquele no qual pensamos. Contudo, se dermos vazão ao desequilíbrio, à incompreensão, à lamentação e à revolta, não há a menor dúvida de que nossas vibrações atingirão o desencarnado como um projétil repleto de veneno fatal.

Como no caso de Alonso, existem várias situações em que a dor não é opcional, mas o sofrimento sim. A separação causada pela morte do corpo carnal desencadeia um processo doloroso para os envolvidos. Não há como fugir disso. Para pelo menos amenizar o sofrimento, é imperioso a compreensão das Leis Divinas e dos mecanismos que regem o mundo espiritual e suas relações com o mundo físico. Por isso encerramos com uma pérola da sabedoria de Alfredo: “Tenho a impressão, Alonso, de que Deus nos deixa sozinhos, por vezes, a fim de refazermos o aprendizado, melhorando o coração. A soledade, porém, quando aproveitada pela alma, precede o sublime reencontro. ” [2]

 

Valdir Pedrosa

 [1] Os Mensageiros – Pelo Espírito André Luiz, psicografado por Francisco Cândido Xavier – capítulo 26 (Ouvindo servidores).

[2] Pão Nosso – Pelo Espírito Emmanuel, psicografado por Francisco Cândido X