Erraticidade: período de refazimento e aprendizado
“Há muitas moradas na casa de meu Pai; se assim não fosse, já eu vo-lo teria dito, pois me vou para vos preparar o lugar. (João 14:2.)”
Superada a compreensão de que a vida após a morte e a reencarnação são realidades da sabedoria Divina, uma nova questão se coloca: o que ocorre com as almas quando não estão encarnadas? Na questão 224 de O Livro dos Espíritos, Kardec pergunta aos espíritos exatamente isto: “o que é a alma no intervalo entre as encarnações?” A resposta é direta: “Espírito errante, que aspira a novo destino, que espera.” Os dicionários da Língua Portuguesa dão como sinônimo de “errante” os termos “vagueante, que vagueia, que não tem residência fixa, que vive como nômade.” Desta forma, o termo derivado, erraticidade, que denomina este artigo, refere-se a momentos na vida dos espíritos em que eles vagam, livres da matéria tangível, podendo se deslocar pelos espaços do universo. O termo errante não traz, então, relação com o substantivo erro, como muitos, equivocadamente, consideram. Tal confusão decorre da associação que se faz entre a necessidade da reencarnação que a Lei de Progresso nos impõe e os erros e falhas que, ainda, cometemos com os que conosco se relacionam, em função da nossa baixa compreensão em relação à moral do Cristo.
Estar na erraticidade é estar na condição natural de espírito, é estar no “[…] mundo espírita, que preexiste e sobrevive a tudo”.¹ Estar encarnado é condição temporária do espírito. Assim, “Não somos seres humanos vivendo uma experiência espiritual, somos seres espirituais vivendo uma experiência humana”, segundo Teilhard de Chardin.²
A condição de espírito errante causa curiosidade e especulações diversas entre os que não estudam seriamente a Doutrina Espírita, não raro criando mitos e teorias excêntricas sobre as relações entre os dois planos da vida,o plano dos encarnados (plano físico) e o plano dos desencarnados (plano espiritual). Com base, entretanto, nas informações trazidas no início do Capítulo VI de O Livro dos Espíritos aprendemos que o intervalo entre as reencarnações é de duração variável: “[…] Desde algumas horas até alguns milhares de séculos. Propriamente falando, não há extremo limite estabelecido para o estado de erraticidade, que pode prolongar-se muitíssimo, mas que nunca é perpétuo. Cedo ou tarde, o Espírito terá que volver a uma existência apropriada e purificá-lo das máculas de suas existências precedentes.”³
Na categoria de errantes, os Espíritos têm oportunidade de progredir. O estudo, o aconselhamento de Espíritos que lhes são superiores, a observação, as experiências vivenciadas, entre outros, facultam-lhes os meios de melhoria espiritual.4
O filme Nosso Lar destaca intensamente tal situação. O estado de erraticidade cessa quando o Espírito atinge o estágio da Perfeição Moral, tornando-se Espírito Puro. Não é mais errante, visto que chegou à perfeição, seu estado definitivo.5 Conforme o grau de perfeição que tenham alcançado, estes permanecem ligados a determinadas colônias na Espiritualidade. Nessas regiões elevadas do Plano Espiritual, atuam como orientadores, promovendo o progresso da humanidade terrestre.
Sendo a maioria dos Espíritos desencarnados em nosso planeta, a diversidade dos níveis evolutivos dos Espíritos errantes variam ao infinito. São mais ou menos felizes […] conforme seus méritos. Sofrem por efeito das paixões cuja essência conservaram, ou são felizes, de conformidade com o grau de desmaterialização a que hajam chegado. Na erraticidade, o Espírito percebe o que lhe falta para ser mais feliz e, desde então, procura os meios de alcançá-lo.6
As ideias, e, consequentemente, os conhecimentos dos Espíritos modificam-se quando na erraticidade. Com efeito, […] sofrem grandes modificações, à proporção que o Espírito se desmaterializa. Pode este, algumas vezes, permanecer longo tempo imbuído das ideias que tinha na Terra; mas, pouco a pouco,a influência da matéria diminui e ele vê as coisas com maior clareza. É então que procura os meios de se tornar melhor.7
Muitas são as moradas mentais, espirituais e físicas anunciadas por Jesus e todas concorrem para as transformações morais que necessitamos.
Rômulo Novais
1 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93.ed. 9. imp. (Edição Histórica). Brasília, DF: FEB, 2019. q. 85.
2 Pierre Teilhard de Chardin (1881/1955) foi um padre jesuíta, teólogo, filósofo e paleontólogo francês que tentou construir uma visão integradora entre ciência e teologia.
3 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93.
ed. 9. imp. (Edição Histórica). Brasília, DF: FEB, 2019. q. 224-a.
4 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93.
ed. 9. imp. (Edição Histórica). Brasília, DF: FEB, 2019. q. 226
5 ______. ______. q. 227.
6 ______. ______. q. 231.
7 ______. ______. q. 318.