Tolerância, Evangelho e atualidade
Nos últimos tempos a internet proporcionou a democratização da informação, na qual foram ampliados os canais de interação da sociedade – redes sociais, televisão, aplicativos, comércio, negócios, viagens, notícias, etc. e, ao mesmo tempo, encurtadas as distâncias físicas. Não sendo incomum que fatos ocorridos do “outro lado do mundo” ganhem repercussão instantânea para cada um de nós que estamos “antenados”, “on-line” ou ainda “logados” nas informações que mais nos agradem.
O fato de permanecermos online nos permite a pronunciar nossas opiniões a respeito de diversos temas, ainda que sem a devida profundidade que o tema mereça, no qual a resposta rápida, parece-nos, “ganha ar” de seriedade e verdade “absoluta”. De modo que, não admitindo opinião contrária a nossa, ou a do grupo dominante a que pertencemos, ou ainda qualquer contradição, sermos classificados imediatamente como radicais. Mas a que servirá a polarização radical? Onde há espaço para convivência e a tolerância? O diálogo não vale mais a pena porque a opinião é contrária? Queremos ter amigos ou ter razão?
Estamos crescendo como sociedade justamente porque há diversidade, na qual aquele que “sabe mais” contribui para elevar aquele que “sabe menos”, e aqui não estamos falando só de inteligência, pois o que falta em um complementa-se no que sobra do outro. Numa equação de cooperativismo, no qual não há vencedores ou ainda dominantes, mas sim seres fraternos, criados por um Pai amoroso, misericordioso e tolerante com nossas mazelas acima de tudo.
Nós precisamos de paz interior nas relações afetivas, no trabalho, para que a inquietude não nos perturbe, ou pior, não permita que possamos ver no outro não somente uma pessoa, mas um(a) irmão(ã) de caminhada. E somente a convivência social nos permite desenvolver nossas habilidades, físicas e morais.
No atual contexto social, naturalmente temos falado a respeito de tolerância, política, religião, família, etc. mas como “bandeira de ação”, sem, entretanto, termos trabalhado esses temas em nossos corações, com o olhar proposto pelo Mestre Jesus no Evangelho. Especificamente, por mais que ouçamos falar da tolerância, os casos de violência marcados pela intolerância de vários matizes aumentam.
Tolerância quer dizer qualidade de quem tolera, na qual quem tolera suporta as atitudes, ações daqueles que ainda desconhecem ou ignoram como se deve proceder ou ainda, de forma ególatra, pensam somente em si mesmo.
Na criação Divina o espetáculo é da diversidade, assim, devemos respeitar a individualidade de cada ser que compartilha conosco o ambiente terrestre. “Se cada um se encontra em degraus evolutivos diferentes é natural que não sejamos compreendidos por aqueles que se posicionam numa escala inferior à que já atingimos, tanto quanto encontramos dificuldades para exemplificar o desprendimento e amor daqueles que já alcançaram os planos mais elevados da vida (1)”.
Assim, o ser tolerante é indulgente para com as imperfeições alheias, seja em que aspecto for. Essa é a caridade que Jesus nos ensina, e para relembrarmos, consultando o Livro dos Espíritos, questão 886, encontramos o esclarecimento acerca do verdadeiro sentido da palavra caridade: “benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas.”(2)
É certo que as virtudes caridade, benevolência, indulgência e perdão, são qualidades a serem adquiridas e aperfeiçoadas por nós mesmos, no trabalho incessante no bem, a fim de favorecer a nós mesmos e ao nosso próximo. É trabalho inadiável, tendo por finalidade integração com nosso Pai celestial, como herdeiros que somos do seu legado. Então mãos a obra, vamos encarar o “bom combate” contra nossas imperfeições morais, que constituem nossos maiores inimigos e residem dentro de nós mesmos. Nossos pensamentos e criações mentais dizem muito de nós e do modo como vivemos, sendo que provocamos os maiores impactos das nossas vidas, seja no construir, seja no destruir.
Combatamos em nós toda intolerância, começando por exercer o respeito ao próximo, permitindo-nos o silêncio ante atitudes reprováveis mas com a mão estendida para ajudar o caído. Porque hoje é o irmão, mas amanhã poderá ser cada um de nós. Não vamos nos inquietar com as atitudes alheias, pois o outro é o outro e o modo como conduzimos a vida diz respeito a nós mesmos.
Comecemos em nosso lar, utilizando-nos da gentileza que dispensamos a qualquer um na rua, ampliando nossas ações na escola, no trabalho, no centro espírita e na sociedade, até que essa virtude faça-se presente nos nossos pensamentos e atitudes, como nos ensina o Mestre Jesus: “ame ao próximo como a ti mesmo”(3)
Tolerância é caminho de paz.
João Jacques de Freitas
(1) https://www.uemmg.org.br/cofemg/area-de-infancia-e-juventude/ conteudo-programatico/livro/6-conduta-espirita-vivencia-39, acesso em 15/10/2019.
(2) Livro dos Espíritos, Editora FEB, Kardec, Alan. Questão 886
(3) Mateus 22-37:39