Culto no lar: luz do Cristo em nossos corações

Os dias atuais têm trazido profundas mudanças em nossas manifestações de religiosidade e espiritualidade, em nossas demonstrações de comunhão e transcendência, principalmente diante da impossibilidade de nos reunirmos nos templos convencionais de oração. Sempre buscávamos saciar a nossa sede de comunhão, de pertencimento, fortalecimento da fé, através das reuniões, tarefas, passes, receituários, enfim, através da integração entre os dois planos da vida, que até então era com a nossa presença física na casa espírita, o que nos trazia a sensação de completude.

No entanto, trazemos em nós a certeza de que a Fraternidade Espírita Irmão Glacus sempre permanece “ombro a ombro, lado a lado” conosco, em todos os momentos, amparando-nos, fortalecendo-nos, intuindo e instruindo-nos, continuando sua atuação como celeiro de bênçãos, escola e hospital, porém agora de uma forma diferente, que alcança cada um de nós em seu recolhimento atual.

É preciso salientar, entretanto, que a proposta de nos recolhermos significa algo mais que aguardar que a luz do mundo exterior chegue até nós. O convite contemporâneo é de reforçar a necessidade de percorrer o caminho inverso: acender em nossos lares a luz do Evangelho do Cristo, para que ela se propague para o mundo. Através da força das circunstâncias, Cristo renova seu grande chamado para todos nós: façamos o Culto Cristão no Lar! Dediquemos pelo menos uma, das sete noites semanais, ao Culto, para que Jesus venha nos visitar.

Assim já nos orientava a nossa querida benfeitora espiritual Joanna de Ângelis, no Capítulo 59, “Jesus Contigo”, de sua primeira obra, intitulada Messe de amor e psicografada por Divaldo Pereira Franco, ressaltando a importância de não nos afastarmos da linha direcional do Evangelho com os familiares, de debatermos os problemas que nos afligem à luz clara da Boa Nova, de examinarmos as dificuldades que nos perturbam ante a inspiração consoladora do Cristo. Trazermos o Evangelho para os nossos dias, refletindo sobre o cotidiano da vida familiar, considerando esse compromisso como sagrado, não nos permitindo sair de casa na noite definida para o Culto, “senão para os inevitáveis deveres que não possas adiar”.

Muitas pessoas ainda acreditam que os textos evangélicos são um material de difícil compreensão, e que somente mestres, teólogos, padres, pastores e expositores espíritas tem a capacidade de estudo e interpretação. Pensar assim é atribuir somente ao outro o que também cabe a nós realizar. Embora esses irmãos tenham um papel muito importante nas pregações públicas, no despertar do coletivo, educando, instruindo, nos inspirando, indicando caminhos novos para atender a todos; o lar continua sendo o templo mais nobre porque oferece oportunidade de esforço todo dia na própria iluminação. Os instrutores, educadores, nos ajudam a ler, mas somente Jesus nos ensina a proceder em cada passo da nossa existência.

Estamos todos caminhando para Deus, rumo à perfeição espiritual e, evoluindo passo a passo, não podemos perder a oportunidade do esforço de cada dia que o Evangelho no Lar nos proporciona. Esforço para aplicar o que aprendemos. Esforço para não perder a oportunidade que cada criatura ao nosso lado nos traz para exercitarmos a compreensão, a bondade, a tolerância, a paciência e o perdão; o que representa muitas vezes conviver sob o mesmo teto com adversários do passado, convertidos em filho, pai, mãe, irmão, cônjuge, etc. e realmente aceitá-los como são hoje, onde foram colocados por Deus, e estarmos receptivos à transformação dos nossos próprios sentimentos para melhor, com a aceitação do que não podemos mudar e a coragem para as mudanças que forem necessárias, pautadas sempre no amor ao próximo como a nós mesmos.

Não raras vezes, é chegada a hora do culto no lar e nos encontramos magoados com um familiar ou atribulados com algum fato acontecido. Somos então visitados pelo desânimo e pensamos até em desistir do culto naquele dia. Mas é exatamente nesses momentos de fraqueza e tentações que mais necessitamos de persistência e do auxílio da sintonia de Jesus, convidando-o mais uma vez a sentar-se ao nosso lado, a nos intuir nas interpretações evangélicas, nos comentários, a nos fortalecer para enfrentarmos a arena nossa de cada dia, onde os nossos inimigos internos (raiva, revolta, orgulho, preguiça, vaidade, maledicência, egoísmo, superioridade, medo, etc.) sobressaltam, muitas vezes avassaladores, tornando nossas atitudes reativas, impulsivas, nos afastando do amor que Cristo nos ensinou.

Jesus, ao nosso lado, nos recordará sempre que as armas para vencermos esta batalha dentro de nós mesmos estão contidas no Evangelho e que estudadas, pelo menos semanalmente, nos darão sustentação para a vitória sobre as imperfeições, compaixão para os erros próprios e alheios, calma para a enfermidade, paciência, fé e bom ânimo para levantarmos todas as vezes em que cairmos nessa longa caminhada… Ele nunca disse que seria fácil segui-lo, mas afirmou que nunca nos deixaria sozinhos. Confiemos!

A esplendorosa obra de Emmanuel, Renúncia, psicografada por Chico Xavier, cuja leitura nos acrescenta muito a cada vez que lemos, retrata a grandeza da tarefa de Alcione, no papel de uma dona de casa que se dispõe a amar verdadeiramente os que estão mais próximos, renunciando a tudo por esse amor. A obra é toda enriquecida pelos ensinamentos profundos de Jesus, que Alcione demonstra com a própria vida, inclusive, nos trazendo valiosíssimas reflexões e orientações para realizarmos o Culto no lar.

Em um dos seus cultos domésticos, Alcione compara o estudo do Evangelho no lar a uma pesca de luzes celestiais que fazemos no rio da vida, que está sempre correndo, e que demanda um esforço nosso, uma vontade ardente para mergulhar e coletar a essência dos ensinamentos de Jesus, que são os elementos fundamentais para a edificação da fé em nossos corações, porque uma vida sem fé, sem esperança, é o pior de todos os males.

A essência do Evangelho não é somente motivo de consolação em nossas fraquezas humanas. Não podemos agir como uma criança que espera apenas adoçar o coração. Se recebermos somente consolação e mimos, envenenamos nossos corações na sede insaciável dos caprichos. Além da palavra consoladora, fonte de conforto e doçura, Cristo também trouxe ao mundo o roteiro de trabalho, que precisa ser conhecido, meditado, sentido, seguido e vivido, mesmo no auge das nossas dificuldades e nossos tormentos.

A visita constante de Jesus em nosso lar nos prepara para este trabalho na seara, e o Cristo nos espera de braços abertos. É o primeiro grande passo em nossa jornada terrena. Preparemos o nosso coração para recebê-lo. Esforcemos para trazer nossos sentimentos e raciocínios à luz do seu Evangelho, através da observação constante do nosso íntimo, autoconhecimento, vigilância, oração, disciplina, trabalhando diariamente com Ele na construção do reino de Deus dentro dos nossos corações e, como diz Alcione, “Dia virá em que tomaremos por templo de Deus o mundo inteiro. (…) Acredito que o lar seja o ninho onde o espírito humano cria em si mesmo, com o auxílio do pai celestial, as asas da sabedoria e do amor, com que há de conhecer, mais tarde, as sendas divinas do universo”.

Adriana Souza