Sensibilidade afetiva

“Se os homens se amassem com mútuo amor, mais bem praticada seria a caridade;
mas, para isso, mister fora vos esforçásseis por largar essa couraça que vos cobre os corações…”
(Pascal. Sens, 1862. Evangelho Segundo o Espiritismo- Cap. XI, item 12)

A afetividade é a capacidade do ser humano de experimentar tendências, emoções, paixões e sentimentos. Por meio do afeto entendemos o mundo, damos significado às nossas relações e à vida.

Observe quão especial se torna uma relação quando expressamos nosso afeto! Por exemplo: um casamento é uma formalidade, mas pode ser muito especial na sua vida quando você está se casando ou é casado com a pessoa que ama. Um trabalho pode ser um difícil ganha pão ou uma oportunidade de fazer seu melhor, de servir ou de estar com pessoas que admira! O luto é outro bom exemplo: quando lamentamos o desenlace de alguém, sentimos saudades, estamos expressando o afeto por aquela pessoa que acaba de partir para pátria espiritual.

Espírito Ermance Dufaux, na obra de Wanderley de Oliveira, Laços de Afeto, tece valorosos comentários sobre nossas inibições ou dificuldades afetivas. Da leitura, extraímos alguns pontos de atenção, como a necessidade de sinceramente refletirmos sobre o tema “endurecimento do afeto” e buscarmos encontrar as “feridas do coração” que lhe deram origem gerando insensibilidade no trato conosco e com os outros. Quais seriam nossas vivências dolorosas, traumas, carências, culpas, revoltas que nos conduziram à instabilidade emocional ou a relacionamentos conflituosos, regados a muita raiva, agressividade e pouca paz? Vamos refletir construtivamente?

Afirma a benfeitora que “quanto mais maduro espiritualmente, mais disposto ao afeto encontra-se o ser”. Mas a maturidade, sabemos, pressupõe muitas experiências construtivas no caminho de evolução de um espírito. É uma conquista trabalhada ao longo dos séculos, com o exercício da ponderação, da honestidade e do serviço amoroso.

 Assim, cada individualidade, neste planeta e neste momento, se encontra num determinado patamar, mas todos, certamente, com a capacidade de reflexão e dedicação rumo à reeducação de tendências, inclinações e sentimentos. Buscar a cura de “antigas feridas” e renovar atitudes, cicatrizando as “feridas do afeto”, é possível para todos nós! Entretanto, ao simples querer há que se somar a disciplina, a fé, a humildade. É preciso romper com os dolorosos grilhões da insegurança, da auto- -piedade, das exigências fantasiosas (“quero ser amado e compreendido por todos”), entendendo que é mais valoroso dar afeto do que recebê-lo, “gratificando-se no ato de amar, mesmo que não seja amado”, reforça Ermance Dufaux.

Sobre a possibilidade de vencermos nossas más tendências, nossos hábitos equivocados, nos esclarecem os Espíritos, na questão 909 da obra de Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, que sempre, através de nossos esforços, e “às vezes, pouquíssimos esforços”, poderíamos superar estas inclinações doentias, mas a verdade é que poucos entre nós estão dispostos a esta empreitada.

O desafio é buscar administrar a sensibilidade afetiva. A sensibilidade, entendida como recurso de elevação espiritual, ilumina o nosso raciocínio e nos permite: “estar sensível ao sucesso escolar do filho, ao esforço da companheira no lar, ao heroísmo do esposo em servir, proteger… com a reunião familiar para alimentação, com a oração feita em conjunto…”.

A ausência de sensibilidade afetiva nos impede de entendermos os motivos do próximo, estimula a indiferença e nos dificulta a caminhada rumo ao perdão, à tolerância e à aceitação amorosa do diverso. É tempo de mudar!

Tornar nossas relações mais afetuosas passa, sem dúvida, por conhecer nossos sentimentos, dar nome a eles, buscar controlar nossas reações e expressar carinho e atenção em todas as oportunidades, lembrando o que nos ensinou o Mestre Jesus, que não se pode verdadeiramente amar a Deus sem amar ao próximo.

 Letícia Schettino Peixoto

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